29.12.16

fronteira






O Uruguay recebeu-me, ainda antes da fronteira, com um abraço quente e forte, um peito onde deitar a cabeça e beijos doces e ternos. Assim, suavemente.
Nos últimos dias o Brasil tinha-me mostrado um lado mais duro e que me fez realmente sentir fora de casa. O Vale da Utopia, que no segundo dia se tornou num sitio de onde queria fugir, por quem por ali andava, e as horas de espera na rodoviária de Porto Alegre, que foram de tensão, no ambiente menos acolhedor que se pode imaginar.
Sentaste-te ao meu lado no autocarro nocturno entre Porto Alegre e Chuy, me hablaste con tu acento uruguayo, y luego me volvi a sentir en casa como aún no me había sentido en este continente. Senti que realmente me entendias, que a comunicação era assim, leve e fluída. A forma como falavas, o humor, a compreensão, a cumplicidade, até mesmo num início alguma distancia necessária que na verdade aproxima (e tão diferente do Brasil). E deixei-te aproximar.
Partilhamos carinho, falamos sobre o amor e a liberdade (entre tantas outras coisas). Disseste que te encantei, mas não foste tu que me deste a confiança necessária para poder-me mostrar assim, sem filtros? E assim docemente, sem pressas, foram passando os quilómetros, entre conversas, carinho e tentativas de dormir, enquanto na janela, do lado direito, passavam paisagens de planícies escuras, e no alto a lua, a guardar tudo. Disse-te que o meu coração estava com alguém em terras argentinas, que não estava ali inteira (sempre esta necessidade de dizê-lo tudo). Respeitaste. E deste-me o que tinhas. Eu dei-te o que podia.
Mostraste-me o teu lado mais doce, aquele que dificilmente mostras, disseste que voltaste a sentir o encantamento e a magia.
Eu senti-me acolhida, segura, e no fundo, um grande sentimento de alivio. E a dualidade entre a necessidade (que tento evitar) e o bem que me sabe essa sensação de protecção masculina. Talvez porque seja o único sitio onde consigo deixar sair o meu lado mais frágil, e simplesmente deixar que me cuidem. E tu cuidaste-me, da melhor forma que podias, durante as seis horas que durava aquela viagem pelas planícies escuras do sul do Brasil.
Eu saí na Aduana do Uruguay, tu seguias para Montevideo.

Depois uma espera em plena fronteira, entre as quatro e as sete da manhã, enquanto para mim amanhecia pela primeira vez em terras uruguayas. E apesar de todo o ambiente hostil daquele não-lugar, tinha ainda em mim toda a ternura que me deste naquela viagem estranha pela noite dentro, entre o Brasil e o Uruguay (ou era daquele mágico amanhecer?).



Aduana do Uruguay, Chuy

8 comentários:

  1. Um ano muito feliz, querida Ana. Onde quer que estejas.

    Um abraço aqui de longe, do sítio frio onde estou a escrever os meus desejos de coisas boas.

    Mar

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    1. Muito obrigada querida Mar!
      Um ano para ti cheio de coisas bonitas e de momentos de magia *
      Um beijinho grande daqui, de uma tarde bem quente em Montevideo.

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  2. Feliz ano de 2017 com muitas surpresas, boas viagens e muito boas experiências.
    beijinho grande

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  3. Ah, Uruguay...Um dia vou aí fazer uma visita aos charrúas.

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    1. Vem Julian, vem!!
      Um beijinho daqui e saudades tuas *

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  4. Como eu gosto de passar por aqui, de te saber pelo mundo.
    És uma inspiração.

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